As 10 principais lições da última reunião do FMI – Carta Mensal Mai/24 | TAG Investimentos

O giro pelos Estados Unidos apenas confirmou a nossa visão de que teremos um resto de ano desafiador, com muita volatilidade econômica, geopolítica e eleitoral. Teremos um ambiente de inflação mais teimosa e com juros mais altos, o que nos remete a um posicionamento mais defensivo em todas as classes de ativos, tanto no Brasil, quanto globalmente. 
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Por André Leite - 07/05/2024
8 min de leitura

Estivemos recentemente nos Estados Unidos para a Reunião da Primavera do FMI de 2024. Esta reunião ocorre sempre na capital dos Estados Unidos, Washington, DC. Além da reunião do FMI, onde temos palestras e debates de oficiais de governos e membros da academia sobre a economia global, também temos inúmeros seminários de bancos privados, com um foco mais voltado para investimentos. Nesta viagem, além de visitar alguns gestores de hedge funds em NY, participamos dos eventos da Goldman Sachs, JP Morgan (o maior deles) e também do evento do Itaú, focado na América Latina.

A seguir, listamos os dez principais aprendizados desta imersão com os principais players do mundo dos investimentos globais:

1. Os EUA continuam no topo:

O dólar está forte e os EUA seguem crescendo bem mais que o resto do mundo. Eles têm as tecnologias mais avançadas em IA e biotecnologia, o exército mais poderoso, incentivos monstruosos para investimentos, impostos corporativos mais baixos e um sistema jurídico que dá confiança aos investidores. Por que o capital iria para outro lugar, não é mesmo? 

A conclusão aqui é tanto por diferencial de crescimento, como por diferencial de juros, que o dólar deverá se manter forte, assim como a precificação das ações americanas, comparadas com o resto do mundo.

2. Juros altos por mais tempo não é sinônimo de recessão:

A comunidade internacional acha que os juros vão ficar altos por um bom tempo. Muita gente está torcendo para que isso não derrube o crescimento, mas isso está mais para esperança do que para certeza.

A maioria dos modelos de negócio após 2008 foi construída tendo como base os juros perto de zero, ou seja, despesa financeira muito baixa para as empresas. Com um mundo onde tanto o endividamento público como o privado são altos, agora temos uma despesa financeira alta e sem perspectiva de redução no curto prazo.

Particularmente neste item, achei a conclusão mais uma torcida do que uma previsão baseada em dados. O fato é que quanto mais tempo a economia global roda com juros altos, as chances de acidentes financeiros aumentam.

3. Política e mercado x riscos geopolíticos: 

Até agora, conflitos como Ucrânia/Rússia, Hamas/Israel e Irã/Israel não conseguiram abalar os mercados. Concordo que os eventos não foram disruptivos o suficiente e os fundamentos econômicos e também das empresas têm prevalecido.

Porém, a história, repleta de conflitos, nos mostra que nada pode nos assegurar que não teremos uma escalada disruptiva. Na verdade, estamos em uma crescente nas tensões geopolíticas, em vez de um processo de esfriamento de tensões.

Aqui, fica a conclusão para os investimentos, é melhor ter proteções em carteira do que se lamentar depois.

4. Política industrial veio para ficar (e a inflação também):

Olha, isso é grande. Os programas de Biden vão jogar 1 trilhão de dólares na economia nos próximos dez anos. Seja Trump ou Biden, essas políticas industriais e a inflação que vêm com elas não vão sumir tão cedo.

Ambos os candidatos têm a mesma base eleitoral, o trabalhador “blue collar”, que foi o principal perdedor no movimento de globalização, perdendo emprego e renda para a China. Independentemente de quem ganhar, as políticas de conteúdo local, irão permanecer.

Seja por motivos eleitorais, seja por motivos estratégicos militares, o foco aqui não é produzir no lugar mais barato ou eficiente, e sim fazer em casa. Mesmo que isso custe mais caro. Logo, a inflação parece que veio mesmo para trabalhar em um patamar mais alto do que tivemos após a grande crise de 2008.

5. Dívida e déficit fiscal não vão ser testados tão cedo:

Qualquer outro país rodando com déficit fiscal tão alto já teria tido problema. Com o preço da moeda e de seus títulos soberanos colapsando. Mas não os Estados Unidos. Por todos os motivos elencados no item #1 e pelo fato do Estados Unidos ser o emissor da moeda de reserva global, nada ocorreu ou deverá ocorrer no futuro próximo.

Naturalmente esse desbalanço fiscal cobrará o seu preço em mais inflação, menor crescimento e o próprio establishment político irá demandar os ajustes fiscais, porém ninguém espera isso sendo feito por Biden ou por Trump em um próximo mandato.

6. Cedo demais ter um palpite sobre o próximo presidente dos Estados Unidos:

A disputa vai ser acirrada e a campanha bem tensa. Biden tem encostado e sua diferença para Trump nos “swing states” é de apenas 3 pontos percentuais na média.

Vários aspectos da eleição ainda estão em aberto, como o julgamento de Trump, a escolha dos candidatos a vice-presidente e se teremos ou não um candidato independente. Caso tenhamos, espera-se que isso tire mais votos dos democratas do que dos republicanos.

Os dois candidatos são velhos conhecidos do público, cada um com suas fraquezas, Biden com a questão da idade e Trump com os seus problemas com a justiça. Os especialistas acham que é mais uma eleição de rejeição do que uma eleição de preferências do eleitor. Dois temas que deverão ser predominantes na campanha é o aborto, pelos democratas, e a imigração, pelos republicanos.

O grande consenso nesta semana nos Estados Unidos é que será uma corrida muito apertada e que é muito cedo para palpites. Também é importante dizer que todos acham que o resultado destas eleições será altamente consequencial para o mundo em 2025, seja na economia, nos juros ou na geopolítica. Só o fim do pacote tributário de Trump de 2017, em 2027, significa que temos 25% do PIB em jogo sobre as alíquotas de impostos e quem vai pagar a maior parte da conta.

7. Mercados emergentes não são destino, mas têm suas oportunidades: 

Ficou claro, pela popularidade dos painéis, que os dois principais mercados emergentes na preferência dos investidores são mais mercados de fronteira, ou situações especiais.

Em primeiro lugar, Turquia, onde após uma sucessão de maus passos de política econômica o governo começa a mostrar algum pragmatismo, e onde temos preços bem deprimidos nos ativos.

Em segundo lugar, a nossa vizinha Argentina, também dando os primeiros passos corretos no governo Milei e ainda com preços dos ativos extremamente baratos.

Países como Brasil, México e África do Sul onde temos preços não tão deprimidos e histórias não muito brilhantes de crescimento, definitivamente estão no limbo, atraindo pouca atenção do investidor. O racional é que o grande “mercado emergente” do mundo é os Estados Unidos, crescendo muito e com temas de investimento super quentes. Para que a pasmaceira dos emergentes tradicionais? 

No evento do JP Morgan, chamou atenção uma pesquisa onde cerca de 40% dos presentes não investem atualmente, e nem pensa em investir na China. O divórcio oriente ocidente corre a passos largos.

8. Aposte em commodities (e ouro): 

As commodities, como cobre e petróleo, estão em alta por causa do aumento na demanda e falta de investimento. E o ouro, mesmo descolado dos juros reais, continua sendo comprado pelos bancos centrais. O JP Morgan, maior formador de mercado do ouro global, comentou que não tem a mínima ideia de quem tem comprado recentemente nestes volumes, puxando o preço da commodity.

No petróleo a história é de demanda forte (uma painelista do JP Morgan comentou que simplesmente não tem passagem disponível para a China nos próximos 2 meses), porém com uma capacidade ainda capaz de atender a demanda (pelos cortes de produção da Arábia). Porém quando olhamos mais o médio prazo, os investimentos na oferta, pela questão de transição energética, estão muito baixos.

No cobre temos toda uma demanda por eletrificação, que ficou ainda mais quente com a demanda por energia, vinda da inteligência artificial. E uma oferta de novas minas estagnada para os próximos anos. Como os estoques globais estão baixos, o consenso é que essa commodity pode se valorizar muito. 

9. A festa do crédito privado está só começando:

Uma modalidade de crédito e de investimento que tem crescido muito nos Estados Unidos nos últimos anos é o crédito privado direto, onde fundos emprestam diretamente para as empresas sem passar pelo sistema bancário tradicional (seja crédito dos bancos ou emissões de títulos corporativos).

Por ora é um nicho de USD 2 trilhões em um mercado de crédito de USD 30 trilhões, porém vem crescendo em ritmo acelerado, com spreads menores e com garantias mais frouxas. É muito dinheiro correndo atrás de poucos ativos. Ainda não tem muita regulação nesta área, o que não é exatamente o ideal, mas, por enquanto, sem riscos sistêmicos à vista.

Alguns dados preocupam. Do lado dos ativos (investimentos) temos que 15% dos ativos das seguradoras americanas está investido neste tipo de classe de ativo. O consenso é que por ora não representa risco para o sistema financeiro, mas tem de ser regulado e supervisionado.

10. Bancos centrais de mercados emergentes ainda podem reduzir os juros: 

Este foi um consenso que nós, particularmente, discordamos. Bastou uma enorme reprecificação dos cortes de juros nos Estados Unidos para a nossa moeda, o BRL, ter recebido o distintivo de pior moeda do mundo em 2024.

Sabemos que um dos fatores que mantém as moedas emergentes ancoradas é justamente o diferencial de juros, e, quando este diferencial cai muito, as moedas emergentes podem entrar em uma região de não linearidade, com depreciação rápida, o que se traduz em maior inflação.

Com a inflação subindo e a economia complicada, talvez os bancos centrais emergentes precisem ser cautelosos antes de pensar em cortar juros, possivelmente reduzindo o ritmo de cortes previstos, ou, em alguns casos, até congelando o ciclo de cortes de juros.

Conclusão

O grande resumo destes dias fora do país é que os investidores estrangeiros meio que foram pegos de surpresa por essa piora na inflação americana. Ficamos com a sensação de que estão em modo de negação ao crer que mesmo sem cortes de juros significativos, a resiliência econômica americana permanece. Aqui não vimos nem mesmo um reconhecimento de que os riscos aumentaram.

Em termos geopolíticos, é consenso que os Estados Unidos travam uma guerra contra um eixo composto por Irã, Rússia e China. Sendo que esta última é considerada a maior ameaça existencial aos Estados Unidos desde sua independência da Inglaterra. Eventualmente teremos acomodações táticas neste front, mas o consenso é que o estrutural disso não vai melhorar.

As eleições americanas serão fonte de volatilidade, afinal os resultados econômicos e geopolíticos podem ser bem diferentes dependendo de quem ganhar. Em relação à inteligência artificial, eu escutei bem mais iniciativas do lado de redução de custos do que de aumento de receitas. Por exemplo, o JP Morgan tinha um total de 3 mil funcionários fazendo cadastro, KYC e compliance. Hoje, após revisão de processos com AI, são apenas 2 mil.

Em termos de investimentos, o giro pelos Estados Unidos apenas confirmou a nossa visão de que teremos um resto de ano desafiador, com muita volatilidade econômica, geopolítica e eleitoral. Teremos um ambiente de inflação mais teimosa e com juros mais altos, o que nos remete a um posicionamento mais defensivo em todas as classes de ativos, tanto no Brasil, quanto globalmente

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