Questionamentos e provocações (do bem)

Existe uma máxima no nosso mercado que é frustrante…
“O Brasil não perde oportunidade de perder oportunidades”.
Para ser bem-sucedido no mercado brasileiro o investidor não pode esquecer duas máximas e questionar uma terceira.
A segunda máxima a ser lembrada é: “No Brasil, até o passado é incerto”.
E a máxima a ser questionada é: “Brasil, o país do futuro”.
Acho que ninguém irá discordar de mim quando eu digo que o Brasil tem problemas bastante complexos a serem atacados.
Acredito que o problema complexo mais urgente é o da miséria, que acabou se tornando ainda mais sério após a pandemia.
Um problema complexo dificilmente terá soluções simples; mas existem caminhos que podem facilitar a mitigação dos seus efeitos perversos.
No caso da miséria, acredito que crescimento econômico elevado por um período longo seria um caminho efetivo para mitigação dos seus impactos.
Lembremos que o crescimento médio da economia brasileira nos últimos 30 anos foi de aproximadamente 2,4%, nível baixo, que não ajuda combater a miséria.
Nestes longos 30 anos várias medidas foram implementadas visando acelerar o crescimento, mas como os números mostram, não foram suficientes para colocar o país em rota de crescimento sustentável a taxas elevadas.
O que não foi implementado?
Redução da carga tributária.
Sempre é bom enfatizar: carga tributária no Brasil, acima de 30%, é 10 pontos percentuais maior que a carga tributária média de países emergentes.
O mais assustador é ver economistas bem-conceituados acharem natural aumentar impostos na tentativa de lidar com o frequente aumento de gastos públicos.
A aprovação da reforma tributária, que contempla um longo período de transição do velho para o novo modelo de tributação, poderia ser um momento interessante para se introduzir um plano de gradual de redução da carga tributária.
Por exemplo: se houvesse um compromisso formal de se reduzir a carga tributária em 0,5% do PIB ao ano, por um período de 10 anos, haveria uma queda significativa e a carga brasileira se aproximaria da média dos emergentes.
Infelizmente isso não vai acontecer…
Para que acontecesse, seria necessário reduzir de forma significativa os gastos públicos, iniciativa que demandaria corte de privilégios, redução da estrutura administrativa dos governos e a possibilidade de demissão de servidores públicos.
Isso não vai ocorrer e, portanto, é bastante razoável que ao longo do tempo, o Brasil continue apresentando taxas de crescimento medíocres, no melhor dos cenários.
Falando em crescimento, representantes do Governo vêm declarando que o elevado patamar da Selic é o que está segurando o crescimento econômico do país.
A Selic deve cair gradualmente nos próximos meses.
O Relatório Focus do Banco Central prevê que ao final de 2024, a Selic estará em 9,50%.
Eu considero essa projeção agressiva, mas vamos assumir que esteja correta?
Ainda assim, não acho que apenas a queda da taxa de juros será suficiente para fazer a economia crescer a uma taxa elevada.
Um fator fundamental para gerar crescimento, pouco discutido pelo mercado, é a visibilidade do cenário futuro.
Enquanto a visibilidade estiver limitada, principalmente em relação a execução da política fiscal, acho pouco provável que o Brasil atinja patamar de crescimento significativo.
E o mercado de ações?
Consenso é que o mercado Brasileiro está barato e que com a queda na Taxa Selic, ele vai subir.
Alguns questionamentos:
- Taxa longo é mais importante para o mercado de ações do que a Selic;
- Incertezas relacionadas à implementação do novo arcabouço fiscal podem impactar negativamente as taxas longas;
- Não vejo motivos para revisar para cima expectativas de crescimento de médio prazo da economia. Mas e a reforma tributária? Implementação longa não permite revisarmos expectativas de crescimentos dos próximos 2-3 anos.
Portanto, continuo mais cético do que o consenso em relação ao desempenho futuro da Bolsa Brasileira.
Leia também:
Otimismo, pessimismo e o tomador racional de decisões
Humor na B3 melhora ainda mais no início de julho
Sobre o colunista
Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde 2019 atua como gestor do FIA Esh Prospera. Entre 2014 e 2016 foi contribuidor da coluna Palavra do Gestor no jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC do Rio Janeiro, tendo mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.
Este artigo foi útil?