Crise hídrica 2022: como isso impacta os meus investimentos?

Veja como está o nível de água dos principais reservatórios, se haverá crise hídrica em 2022 e como isso impacta seus investimentos.
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Por Alvara Bianca e Gustavo Maia - 09/02/2022
Atualizado em 27/02/2023
11 min de leitura

Apesar das fortes chuvas em janeiro no Brasil, que vieram acompanhadas de enchentes e deslizamentos de terra em diversas regiões, como será que está o nível de água dos principais reservatórios para geração de energia? Vai ter crise hídrica em 2022? E outra pergunta: como tudo isso pode afetar seus investimentos?

É com base nesses questionamentos que trazemos essa resposta para você. Acompanhe!

Crise hídrica 2022

Reajuste na tarifa elétrica

Em 2021, foi possível observar, e sentir no bolso, reajustes na energia elétrica, que por sua vez tiveram reflexos nos preços de vários produtos. Somente em um ano, o reajuste acumulado na conta de luz para o consumidor residencial no Brasil foi de 21,21%. Esse valor é superior ao da inflação acumulada nos 12 meses do ano, que foi de 10,06%. 

Só relembrando: de janeiro a abril foi implantada a bandeira amarela, em maio a bandeira vermelha patamar 1 e em junho a patamar 2 (acionada por causa da piora das condições hídricas). Já em julho e agosto foi mantida a bandeira vermelha patamar 2, mas no valor reajustado de R$ 9,49. 

Com todos esses reajustes, a energia elétrica do Brasil mantém desde o ano passado a condição da segunda tarifa mais cara do mundo. O primeiro lugar do ranking traz a Alemanha. 

Vale pontuar que a energia elétrica é um dos principais componentes inflacionários do país. 

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Além disso, em 2022, o cenário não é nada animador e deve vir mais reajuste por aí chegando aos dois dígitos. Segundo o diretor-geral da Aneel, André Pepitone, o aumento médio das tarifas de energia em 2022 será “muito inferior” à projeção de 21% que consta em documento oficial da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). 

Grande parte da alta esperada é reflexo do déficit entre os custos com a geração de energia e os valores arrecadados nas contas através das bandeiras tarifárias. 

Tarifa extra e novas cores de bandeiras

Vale lembrar que as bandeiras tarifárias foram criadas pela Aneel, em 2015, para repassar aumentos no custo de geração de forma mais rápida aos consumidores. Caso não existissem as bandeiras, o aumento somente seria feito no reajuste anual da tarifa, o que acabava sobrecarregando as distribuidoras.

Conheça como funciona cada bandeira:

Bandeira verde: Condições favoráveis de energia e sem cobrança adicional.

Bandeira amarela: Condições de geração de energia menos favoráveis, e a conta sofre acréscimo de R$ 1,874 por 100 kilowatt-hora (kWh) consumido. 

Bandeira vermelha: As usinas térmicas são ligadas. Indica que está mais caro gerar energia naquele período. A bandeira vermelha é dividida em dois patamares: o primeiro, o valor adicional cobrado passa a ser proporcional ao consumo, na razão de R$ 3,971 por 100 kWh; já o patamar 2 aplica a razão de R$ 9,492 por 100 kWh.

Bandeira escassez hídrica: é ainda mais ‘grave’ que a vermelha 2. Foi criada em agosto de 2021 e adiciona R$ 14,20 às faturas para cada 100 kW/h consumidos. 

Apesar das fortes chuvas do início do ano, a bandeira tarifária de escassez hídrica deve seguir em vigor até o fim de abril.  

Composição da matriz elétrica do Brasil

Segundos dados do Ministério de Minas e Energia, de 2020, a matriz elétrica do país tem a seguinte composição: a fonte hidráulica corresponde a 65,2%, seguida pela biomassa (9,1%), eólica (8,8%), gás natural (8,3%) e as demais.

Dessa forma, a usina hidrelétrica, que gera energia a partir da força da água nos reservatórios, é a mais barata e a primeira opção do Sistema Interligado Nacional (SIN). 

Em épocas de muita chuva e reservatórios cheios, os consumidores costumam pagar a bandeira tarifária verde. 

Já quando há períodos de estiagem, é possível observar queda no nível dos reservatórios, elevando o custo de geração de energia e, consequentemente, a bandeira tarifária muda. Com isso, o governo aciona as termelétricas para suprir a capacidade de abastecimento. 

Apagões no Amapá e racionamento de água em Curitiba

E os reflexos da crise hídrica e energética de 2022 já vem acontecendo há algum tempo. Quem lembra de um dos maiores apagões do país? Quase 800 mil pessoas ficaram sem energia no Amapá por 22 dias, dos quais quatro deles na escuridão total e o restante sob regime de rodízio.

O fato aconteceu em 3 de novembro de 2020, após um incêndio destruir o transformador que levava luz à maior parte da população do estado. Os problemas no fornecimento de energia no Amapá afetaram o abastecimento de água, a compra e armazenamento de alimentos, serviços de telefonia e internet.

É curioso destacar que até setembro de 2015, o Amapá tinha um sistema isolado de produção de energia elétrica separado do restante do Brasil. Para atender a demanda da população do estado, a produção ocorria de duas formas: a primeira pela hidrelétrica de Coaracy Nunes e a segunda pela usina termoelétrica do município de Santana. 

Até essa época, a capacidade de produção era de até 220 megawatts. Porém, durante picos de consumo, a usina termelétrica era acionada gerando custo extremamente elevado para geração de energia. Foi só então em setembro de 2015 que o Amapá passou a fazer parte do sistema interligado nacional (SIN).

Mais recentemente, Curitiba enfrentou quase dois anos de racionamento de água. As chuvas deste início de ano reforçaram a recuperação dos reservatórios, iniciada gradualmente a partir de outubro, e que chegaram ao nível médio de 80,34% da capacidade em janeiro.

Segundo o governo estadual do Paraná, não haverá novo rodízio neste ano. Os reservatórios estão com capacidade para atender a população pelo período de 12 a 16 meses.

Viu só? Esses dois acontecimentos são um alerta de emergência hídrica devido à seca mais severa dos últimos 91 anos. 

Continue a leitura para acompanhar como está o nível de água dos principais reservatórios do país.

A aquisição de energia elétrica

Para garantir o fornecimento de eletricidade aos consumidores, o Brasil tem acionado as usinas termelétricas (mais caras e poluentes) e importado energia da Argentina e do Uruguai. 

De acordo com o Comex Stat, sistema para consultas e extração de dados do comércio exterior brasileiro, de janeiro a julho de 2021, o governo investiu US$ 1,36 bilhão — o equivalente a R$ 7 bilhões — na importação de energia da Argentina e do Uruguai. Um crescimento de 58,5%, se comparado ao ano anterior.

Entre os dois fatores principais que motivam a aquisição de energia por parte do governo federal estão a preservação dos reservatórios hidrelétricos e a diminuição do uso das termelétricas. 

Entretanto, a importação ganha ainda mais relevância em função do baixo nível dos reservatórios, especialmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste.

Como sabemos, para o país ter segurança energética, ele depende do funcionamento das hidrelétricas. 

E esse fato não é novo, desde 2017, o país já comercializa energia da Argentina e do Uruguai, levando em conta a necessidade semanal do Brasil.

E sabe por que compramos energia desses dois países? Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), a negociação é segura, já que os sistemas elétricos do Brasil, Argentina e Uruguai são interconectados e dão mais tranquilidade ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Além de beneficiar o fortalecimento das relações governamentais com os vizinhos.

Situação do sistema hídrico

Após semanas de fortes chuvas no Norte e Nordeste e uma frente de calor inédita do Sul e Sudeste, como está a situação dos reservatórios de água e subsistemas de energia no país?

Segundo dados fornecidos pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), as primeiras semanas do ano, marcadas por fortes chuvas, tiveram impacto positivo sobre o nível dos principais reservatórios do país, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, e deram um fôlego às preocupações relacionadas ao desabastecimento. 

Para aprofundarmos nossa análise, extraímos uma série de dados, fornecidos com frequência diária e semanal, a nível nacional, pelo ONS, que nos contextualizam sobre o cenário dos subsistemas brasileiros, custos de produção, acionamento de usinas térmicas e demanda por energia. São eles:

Energia Armazenada

O indicador de Energia Armazenada (EAR) agrega os valores referentes ao total de energia disponível por subsistema, levando em consideração o volume de água presente nos reservatórios que pode ser convertido em geração em todas as usinas do sistema, frente ao potencial do subsistema.

A maior incidência de chuvas no início do ano favoreceram substancialmente as regiões Norte e Nordeste do país. O fenômeno deve estar relacionado à ocorrência do La Niña, que implica maior precipitação na Amazônia e Nordeste, resultando muitas vezes no aumento da vazão dos rios e maiores enchentes, como observado recentemente na Bahia, em Minas Gerais e em São Paulo. Olhando com atenção aos subsistemas em questão, os dados dessazonalizados apresentaram uma forte recuperação em janeiro frente aos meses anteriores.

O subsistema Nordeste, composto principalmente pela Bacia São Francisco, opera atualmente a 75% de sua capacidade máxima. Em dezembro, o sistema operou, em média, com 58% do seu potencial. Em comparação ao mesmo período do ano anterior, o sistema se encontra hoje em um patamar 34% superior.

O subsistema Norte, subsistema mais isolado e com menor dependência das outras regiões, alimentado principalmente pela bacia do Tocantins, já acumula, na série dessazonalizada, um potencial de energia superior à capacidade da região, muito por conta do volume bastante elevado do reservatório de Tucuruí. Atualmente, o sistema se encontra a 105% de sua capacidade máxima, um grande salto diante do 70% constatado em dezembro e quase três vezes superior ao valor verificado em janeiro de 2021.

O subsistema Sudeste/Centro-Oeste, responsável pela produção e consumo de quase 70% de toda a energia gerada no país, operava, em outubro do ano passado, bastante próximo a sua mínima histórica, com 17,2% da sua capacidade, enfrentando grande risco de desabastecimento. Desde então, na série com ajuste sazonal, os reservatórios conseguiram recuperar parcialmente seu nível, encerrando o ano com a energia acumulada de 35%. 

As chuvas nesse primeiro mês de 2022, principalmente na região de Minas Gerais, contribuíram para a elevação do volume de água nos reservatórios e o indicador de energia acumulada saltou para os 42%. Na comparação com o mesmo período de 2021, houve crescimento de aproximadamente 60%.

Na região Sul, a situação é um pouco mais delicada. Por se tratar de um ano atípico, com a ocorrência do fenômeno La Niña, o sul do país acaba sendo afetado pela menor incidência de chuvas e é caracterizado pela estiagem durante o inverno. Ainda, nessas últimas semanas, a região também se deparou com uma forte onda de calor, que exige ainda mais do sistema elétrico, além de aumentar a evaporação e esvaziar os reservatórios.

O EAR do subsistema Sul, que atingira 50,7% em dezembro, na série dessazonalizada, voltou cair nesse primeiro mês do ano retornando aos 47,3%. Apesar disso, o sistema atingiu sua fase mais crítica da série histórica em novembro de 2020, com leves melhoras até janeiro, assim, na comparação anual, mesmo com a queda em relação ao último mês, os reservatórios hoje estão em um patamar 25% superior. 

Se agregarmos os dados de cada subsistema pelo seu potencial gerador, conseguimos produzir um gráfico para o Brasil como um todo. Por essa ótica, a situação hídrica melhorou de forma substancial nos últimos dois meses. Se olharmos para a série com ajuste sazonal, atingimos um nível que não era visto desde novembro de 2013.

Gráfico de Energia Armazenada no Brasil com dados que vão do ano 2000 até a início de 2022

Geração Térmica

Dados nacionais referentes à geração de energia por usinas térmicas.

Gráfico de Geração Térmica no Brasil incluindo dados de 2013 até 2022

Como mencionado anteriormente, quando os níveis dos reservatórios estão muito baixos, seja por conta da pouca chuva ou elevação de demanda, usinas térmicas são acionadas para recompor a geração de energia e diminuir o risco de desabastecimento e apagões. Porém, as termelétricas também têm custos de produção mais elevados, além de serem mais poluentes, por isso que se verifica uma elevação da conta de luz em períodos de seca.

Observando a série dessazonalizada de geração térmica, percebe-se uma grande elevação da utilização das usinas térmicas a partir de julho de 2020, chegando ao ápice em julho de 2021, correspondente ao período de pior estiagem dos últimos 90 anos.

No entanto, as chuvas no começo desse ano desafogaram parcialmente o sistema elétrico brasileiro e recompuseram os níveis dos reservatórios, sendo responsáveis pela queda da produção termelétrica verificada neste mês, que opera em seu menor patamar desde o início da série histórica e a 10% do valor produzido em janeiro de 2021. 

Custo Marginal de Operação

O Custo Marginal de Operação (CMO), divulgado semanalmente, contempla o custo de se produzir uma unidade a mais de carga de energia no Sistema Interligado Nacional.

Como pontuado antes, o acionamento de termelétricas encarece a produção de energia. Podemos observar que nos períodos de pico do CMO, como em 2014/15 e 2021, que as usinas térmicas estavam operando em níveis bastante elevados e, com os desligamentos verificados em janeiro, houve uma redução brusca do custo de operação.

Atualmente, os subsistemas Norte e Nordeste apresentam um CMO zerado, enquanto os subsistemas Sul e Sudeste/Centro-Oeste tiveram quedas expressivas, saindo de R$ 3.044,45 por MWh no fim de agosto de 2021 para R$ 13.25 por MWh na última semana de janeiro deste ano. Com isso, fica fácil observar como o exposto acima impacta no bolso do consumidor, com uma melhora substancial na questão hídrica foi possível desligar as termelétricas que, por sua vez, reduziram drasticamente o custo de operação do sistema.

Gráfico do Custo Marginal da Operação Agregado traz os maiores picos entre 2014 e 2015 e em 2021

Crise hídrica de 2022 e os seus investimentos

Depois de entender todo esse contexto da crise hídrica no Brasil em 2022 você está se perguntando: qual é a relação de tudo isso com meus investimentos. Pois bem, energia foi o segundo maior vilão da inflação de 10,06% em 2021, contribuindo com 0.91% desse total (9% do total da inflação do ano).

Como mostrado acima, a situação na margem melhorou substancialmente, reduzindo o custo de operação do sistema. Caso não tivéssemos passado por um período tão adverso recentemente, isso significaria queda imediata na conta de luz através da moderação das bandeiras tarifárias, porém o prejuízo acumulado do setor elétrico se encontra ao redor de R$ 12 bilhões o que, mesmo com a atual melhora, ainda torna incerto o cenário para queda na conta de luz.

De qualquer forma, a assimetria de riscos para a conta de luz é de queda para este ano, removendo uma pressão relevante da inflação ao consumidor. Além disso, após um ano de forte desvalorização cambial e de forte alta das commodities energéticas, somado à atuação enérgica do BC e à guinada mais dura do Fed (banco central americano), o risco de termos outro ano de inflação fora do controle parece bem baixo, com risco de termos alguma surpresa positiva (no sentido de inflação mais baixa).

Nesse cenário, os títulos públicos apresentam oportunidades atrativas, em especial os Pré-Fixados (NTN-F) ou, para os mais conservadores, os Pré+IPCA (NTN-B). 

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