Questione sempre as melhores práticas!

O famoso gestor Howard Marks, da Oaktree Capital, tem uma frase que deveria estar destacada nas paredes de todas as gestoras que buscam entregar um desempenho maior do que a média do mercado:
Em tradução livre, a frase é:
“Você não pode agir como todos agem e esperar ter um desempenho superior ao do mercado”.
É necessário coragem para ir contra o que grande parte do mercado está falando.
Não pensem que isso se aplica apenas a investidores pessoas físicas.
Tanto analistas do sell side (corretoras e casas de research independentes) quanto gestores em geral, e de fundos de ação em particular, têm muita dificuldade de tomar posições diferentes do consenso.
Revi no último fim de semana o filme “A Grande Aposta”. Baseado no livro de Michael Lewis, “The Big Short”, a trama conta como alguns investidores se posicionaram na expectativa da queda do valor das hipotecas nos EUA em 2007/2008.
Esses investidores, que foram contra o consenso, foram ridicularizados, perderam recursos, foram questionados na justiça, até sua tese de investimento se mostrar correta e aí então ganhar muito dinheiro.
Parece bem mais confortável seguir o consenso e caso suas decisões se mostrem erradas, você mostra que grande parte do mercado tomou as mesmas decisões.
Mas não é para isso que o investidor “contrata” um gestor ou segue um analista.
Stephen Shapiro já escreveu vários livros sobre inovação.
Um deles se chama “Best practices are stupid (40 ways to out-innovate the competition) – Melhores práticas são estúpidas (40 caminhos para inovar melhor que os concorrentes)”
A mensagem do livro é um pouco diferente do que se inferiria pelo título.
A mensagem é que existem situações em que se deve usar as melhores práticas; mas não sempre.
Questionar as melhores práticas no mercado financeiro sinaliza maturidade e honestidade intelectual.
Vamos falar de valuation como exemplo:
Investidor faz seu modelo de fluxo de caixa descontado, apresenta os resultados que mostram um potencial de valorização elevado e recomenda a compra de ação.
Seguiu as melhores práticas. Mas seria isso suficiente?
Não.
É necessária uma análise detalhada dos resultados com questionamentos em relação às premissas utilizadas.
No caso do uso de múltiplos, analista olha uma ação que apresenta múltiplos bem abaixo do comportamento histórico. Sugere a compra das ações.
Usou as melhores práticas? Sim. Mas também não é suficiente.
Pode haver várias razões estruturais para justificar um múltiplo corrente abaixo da média histórica. Por exemplo: redução nas expectativas de crescimento de longo prazo, aumento do custo de capital próprio, queda nos retornos esperados etc.
Ignorar fatores que podem desafiar a lógica das melhores práticas é um erro comum em nosso mercado de capitais.
Portanto:
- Para gerar retornos acima da média do mercado é preciso ter coragem e argumentos para ir contra o consenso;
- Melhores práticas são muito úteis, mas precisam ser questionadas;
- Inovar no mercado financeiro é deixar de lado as melhores práticas, considerar a sua intuição e pensar no longo prazo.
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Sobre o colunista
Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui mais de 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde junho de 2023 atua com gerenciamento de portfólios na Barra Peixe Investimentos. Entre 2019 e 2023 atuou como gestor do FIA Esh Prospera, e entre 2014 e 2016 foi contribuidor da coluna Palavra do Gestor no jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC do Rio Janeiro, tem mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.
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