Qual o real papel de um CEO?

Recentemente estava assistindo o programa de entrevistas Roda Viva, na TV Cultura, que tinha como convidado “no centro da roda” o CEO da B3.

Dado meu envolvimento de quase 30 anos com o mercado de renda variável, não pude deixar de assistir, mesmo com a oposição da minha esposa que queria continuar a avançar nas histórias de John Dutton, da excelente série Yellowstone.

A entrevista como um todo foi bem interessante ao colocar o tema investimento em renda variável no centro da roda.

Mas o que mais me impressionou foi o uso, a meu ver exagerado, que o entrevistado fez de técnicas de mídia training.

A entrevista acabou sendo um gatilho para que eu começasse a refletir sobre o verdadeiro papel do principal executivo de uma empresa.

Antes de seguir com minha visão, quero enfatizar que se um dia eu voltar a me envolver com a atividade de stock picking, seja no sell side ou no buy side, só investirei em empresas que tenham CEOs que exerçam com excelência os papeis que acredito serem de sua responsabilidade.

Não é fácil, de fora, julgar a qualidade da entrega do trabalho do CEO, mesmo em empresas de capital aberto. Mas quem falou que investir em renda variável é fácil?

Portanto, vai aqui minha visão das reais responsabilidades do CEO:

1- Ser um grande alocador de capital;

No final das contas, o CEO deve ser aquele que vai arbitrar o que a empresa deve fazer com os recursos gerados pelo negócio; investir, distribuir, reduzir a alavancagem, comprar empresas, manter no caixa, etc.

2- Mostrar estar comprometido com a criação sustentável de valor para acionistas e todos os demais stakeholders;

Definição de como criação de valor para cada grupo de stakeholders será medida e processo de monitoramento do desempenho ao longo do tempo precisam ter respaldo da alta administração, principalmente do CEO.

3- Se cercar de profissionais tão ou mais competentes que ele ou ela;

Na minha visão, no mundo ideal, caso haja a necessidade de se substituir o CEO, os principais candidatos deveriam estar dentro de casa. No mínimo, as seguintes áreas deveriam ter profissionais de excelência: finanças, recursos humanos, marketing e vendas, produção e inovação;

4- Gostar e ter um bom desempenho em ser a cara e a voz da empresa perante a sociedade;

Empresas onde o CEO se esconde da sociedade tem ou terão desafios muito maiores para atingir seus objetivos. Mas não adianta mostrar a cara de maneira artificial. Precisa estar disposto a expor corações e mentes da empresa e da pessoa no papel de CEO. Ele ou ela precisam convencer stakeholders e sociedade que pratica o que prega, o famoso “Walk the talk”;

5- Ser o guardião da cultura da empresa;

Cada vez mais aparecem estudos que mostram uma correlação relevante entre cultura organizacional e resultados positivos; o CEO é aquele que tem a responsabilidade de garantir que a cultura desejada seja praticada por todos os funcionários, do mais júnior ao mais sênior;

6- O CEO dever ser ou ter um profissional de alta qualidade como Chief Innovation Officer;

Estou convencido que sem uma estratégia bem desenvolvida e implementada de inovação será muito difícil ser uma empresa longeva e que crie valor de forma sustentável. Para isso, o envolvimento do CEO é fundamental;

7- O CEO precisa ter humildade para escutar e refletir sobre as mensagens que chegam dos seus principais stakeholders;

Em outras palavras, o CEO deve ser alguém que esteja confortável em descer de seu pedestal e que pratique escuta ativa ao se relacionar com investidores, funcionários, clientes, fornecedores, comunidade, e qualquer outro grupo relevante de stakeholders;

Sejamos honestos: quantos CEOs vocês conhecem que praticam todos esses papéis mencionados cima? E que pratiquem pelo menos a maioria deles?

Não gosto muito da ideia do CEO como influenciador que vem sendo sugerida por vários pensadores de mídia, marketing, cultura organizacional etc.

Pode ser problema meu, mas influenciador me passa uma imagem de excesso de artificialidade na postura e na mensagem.

Mas com certeza, os CEOs no Brasil precisam dedicar mais tempo e energia para tornarem a alma da empresa que representam mais conhecida pelo mercado e pela sociedade como um todo.

Para investidores, deixo um pitaco: não dá para investir em uma empresa onde o investidor não possa afirmar que conhece o que pensa seu CEO.

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Sobre o colunista

Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui mais de 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde junho de 2023 atua com gerenciamento de portfólios na Barra Peixe Investimentos. Entre 2019 e 2023 atuou como gestor do FIA Esh Prospera, e entre 2014 e 2016 contribuiu na coluna Palavra do Gestor do jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC-RJ, tem mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.