Por que usar o EBITDA na tomada de decisões financeiras é inadequado
Neste fim de semana, estava eu navegando pela internet, quando me deparo com um post de sócios de uma dessas escolas que prometem transformar reles mortais em super-executivos. O post dizia:
“Métrica de vaidade: faturamento alto; métrica de realidade: EBITDA e geração de fluxo de caixa”
Quem acompanha minhas opiniões já deve ter visto eu argumentar que usar o faturamento como base para o valuation de uma empresa é uma distorção gigantesca do conceito de valor. Mas não podemos negar que o desempenho de um negócio depende totalmente da capacidade da empresa gerar faturamento. Portanto, está longe de ser uma métrica de vaidade apenas.
Mas é no EBITDA onde eu gostaria de concentrar a análise neste artigo.
Muito profissional de mercado com anos de experiência, boa formação e sucesso comprovado continua a usar e abusar do uso do EBITDA como métrica de desempenho e como principal input para o valuation de uma empresa.
Muitos desses profissionais repetem sem pensar que o EBITDA é a geração de caixa operacional de um negócio.
Mas não é….
O cálculo do EBITDA (Receita Líquida – custos – despesas operacionais + depreciação) não incorpora o investimento em capital de giro que, em muitos casos, acaba se tornando o maior item de saída de caixa de um negócio, principalmente se a empresa estiver em um período de crescimento acelerado.
Quando se diz que o EBITDA é a geração de caixa da empresa, peca-se por não considerar, além do investimento em capital de giro, também o investimento em ativos fixos, ativos intangíveis ou mesmo o investimento para adquirir novas empresas.
Além disso, o EBITDA não considera as saídas de caixa decorrentes do pagamento de impostos. Será que alguém aqui vai discordar se eu disser que no Brasil, pagamento de impostos é uma saída de caixa relevante de qualquer empresa?
Se alguém estiver realmente interessado em analisar um indicador correto para o desempenho financeiro de uma empresa, deve olhar a geração do fluxo de caixa livre que subtrai do fluxo de caixa operacional, o pagamento de impostos e os investimentos em capital de giro, ativos fixos e intangíveis.
Vamos dar uma olhada no desempenho financeiro da Tesla no período de 2020 a 2024. Vejam na tabela abaixo a diferença entre o EBITDA e o fluxo de caixa livre na empresa no período:
2020 | 2021 | 2022 | 2023 | 2024 | |
EBITDA Ajustado | 5.817 | 11.621 | 19.186 | 16.631 | 16.646 |
Fluxo de Caixa Livre | 2.786 | 5.015 | 7.566 | 4.358 | 3.584 |
FCF/EBITDA | 47,9% | 43,2% | 39,4% | 26,2% | 21,5% |
Fonte: Tesla e Sérgio Goldman
Como vemos nesta tabela, as diferenças entre EBITDA e fluxo de caixa livre da Tesla no período analisado são significativas.
Você deve estar pensando: entendo teus argumentos, mas então porque tanta gente “boa” usa e abusa do uso do EBITDA?
Tenho minhas teorias:
Primeira: efeito manada. Se muita gente usa então deve estar correto. Além disso, tem aquela necessidade de pertencimento e de usar a linguagem que os pares usam sem se questionar se o que falam está correto ou não.
Segunda teoria é que o conceito e o cálculo do EBITDA são mais simples do que os do fluxo de caixa livre. Com isso, pessoas que não são especialistas em finanças acabam preferindo usar o mais simples.
Para concluir gostaria de deixar bem claro: quem continua a tomar decisões com base no EBITDA, não conhece os conceitos básicos de finanças corporativas e tem grandes chances de tomar decisões equivocadas.
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Sobre o colunista
Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui mais de 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde junho de 2023 atua com gerenciamento de portfólios na Barra Peixe Investimentos. Entre 2019 e 2023 atuou como gestor do FIA Esh Prospera, e entre 2014 e 2016 contribuiu na coluna Palavra do Gestor do jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC-RJ, tem mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.
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