O que funciona no investimento em renda variável no Brasil?

Estava passando os olhos em minha biblioteca e um livro me chamou a atenção. O livro era “What works on Wall Street”, escrito por James P. O’Shaughnessy, e tem como subtítulo “a guide to the best-performing investment strategies of all time”.

Ao ver esse livro, comecei a refletir se existe uma estratégia claramente vencedora para investimentos em renda variável no Brasil.

Acho que estratégia vencedora não existe. Mas existe sim comportamentos a atitudes que devem ser adotados para aumentar consideravelmente a probabilidade de sucesso ao investir em renda variável; aqui estamos falando em renda variável em suas diversas opções: bolsa, private equity, investimentos estratégicos etc.

Favor notar que a maioria das atitudes sugeridas são comportamentais e não ligadas aos fundamentos da empresa analisada. Com isso em mente, vamos lá:

Investimento em renda variável no Brasil (na verdade, em qualquer lugar) é de longo prazo

Eu sei…você deve estar pensando: o velho e abusado clichê de investimento de longo prazo. Mas a pura realidade é que, infelizmente, a maioria diz que pratica, mas na prática é apenas teoria. O que seria longo prazo? Pelo menos 3 anos.

Tenha sempre uma tese de investimentos para suas posições em renda variável

Ter uma tese de investimentos, que precisa ser monitorada e ajustada se necessário, facilita deixar o investidor confortável em manter sua posição no longo prazo. A tese de investimentos mostra como a empresa planeja criar valor ao longo do tempo. Posicionamento competitivo, estratégia de negócios, oportunidades de crescimento, drivers de valor são alguns dos fatores a serem considerados na tese de investimentos.

Evite se posicionar em empresas que estão sendo recomendadas por influenciadores ou mesmo por profissionais de mercado nas mídias sociais.

A decisão de investimentos em renda variável é complexa e envolve número grande de variáveis. Seguir a manada com base em análises superficiais é um caminho curto e certo para um mal investimento.

Não entre em bola dividida: seja sempre conservador em suas premissas e na dúvida não invista.

Se for fazer conta ou se for se basear nas contas de algum player do mercado, cheque as premissas utilizadas e analise se elas fazem sentido em um país que nos últimos 40 anos cresceu a uma média de 2,4% ao ano. É muito comum ver recomendação de ações sendo feitas com expectativas de crescimento de mais de 10% ao ano de hoje até um futuro distante. Pode ser possível, mas mais provável é que seja uma perspectiva muito otimista. De novo, seja sempre conservador e na dúvida busque outras opções de investimentos.

Você confia na administração da empresa?

A confiança aqui se refere a capacidade da gestão de fazer a empresa criar valor de forma sustentável para seus stakeholders e confiança de que vai tocar a empresa com elevados padrões éticos. Sei que é difícil analisar de fora estas duas abordagens para confiança. Uma dica: veja a composição do conselho de administração ou conselho consultivo em empresas menores. As competências representadas nos membros do conselho são aquelas necessárias para capacitar a empresa a criar valor de forma sustentável? Se não forem, busque outras opções de investimentos.

Invista em empresas que se sintam confortáveis em se comunicar com o mercado e com os demais segmentos da sociedade

É complicado investir em empresas que claramente evitam se expor à sociedade. Em alguns casos, mesmo empresas de capital aberto, que são obrigadas a divulgar informações, tem uma postura reticente e evitam discutir assuntos relevantes publicamente.

Qual a importância que a empresa dá ao tema inovação?

Hoje em dia, inovação é tema estratégico que precisa ser cuidado pelo conselho de administração. É importante que a diretoria executiva tenha algum profissional experiente sendo responsável por inovação. Cuidado para não cair em discurso vazio sobre inovação.

Busca por resultados é parte relevante na cultura organizacional da empresa?

Empresa que não atinge bons resultados dificilmente se tornará uma empresa longeva. Busca por resultados deve ser parte da cultura organizacional. Sabemos que mudar a cultura de uma empresa é desafio bem complicado. Portanto, melhor não investir em uma empresa sem comprometimento com melhoria sustentável de seus resultados.

Essa lista pode ser vista como necessária, mas não suficiente, o que reforça o que venho dizendo há algum tempo: investir em renda variável é bastante complexo e requer conhecimento e experiência. Não credite em análises superficiais e receitas infalíveis de ganhar muito dinheiro sem fazer esforço.

Leia também:
Como a macroeconomia impacta as intenções de M&As e IPOs?

Sobre o colunista

Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui mais de 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde junho de 2023 atua com gerenciamento de portfólios na Barra Peixe Investimentos. Entre 2019 e 2023 atuou como gestor do FIA Esh Prospera, e entre 2014 e 2016 contribuiu na coluna Palavra do Gestor do jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC-RJ, tem mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.