Non-deal valuation: o dever de saber como aumentar o valor de sua empresa
Venho defendendo a tese de que toda empresa deve passar por um processo independente de valuation com base no fluxo de caixa descontado.
Recentemente, ao mencionar isso em uma conversa com um sócio de uma gestora de private equity, ele reagiu com a seguinte questão:
“… eu não tenho intenção alguma de vender a minha empresa, nem de buscar um sócio minoritário. Por que então eu deveria fazer o valuation da minha gestora?”
Eu dei a seguinte resposta para ele:
O primeiro motivo é saber de verdade como está alocado seu patrimônio pessoal.
Se você possui uma participação relevante em uma empresa, muito provavelmente o valor desta participação representa grande parte do seu patrimônio. Me parece aconselhável saber quanto essa participação vale e a partir daí sua participação no seu patrimônio como um todo.
É comum ouvirmos um empresário dizer: a maior parte do meu patrimônio está em renda fixa. Mas nesta afirmação, ele ou ela não está levando em consideração o valor do seu negócio. Ao incorporar esse valor, ele (ou ela) se surpreende ao ver que de fato, grande parte do seu patrimônio está em equities.
O segundo motivo é entender a fundo como tem sido o desempenho do seu negócio e saber quais seus principais drivers de valor ou, em outras palavras, onde a administração da empresa deve focar para colocá-la em rota de criação sustentável de valor.
Gosto de afirmar que um valuation com base no fluxo de caixa descontado, quando bem-feita, inclui as seguintes etapas, todas ela fundamentais como inputs para tomadas de decisões estratégicas:
1. Diagnóstico operacional e estratégico:
Através de uma imersão no desempenho histórico da empresa, o processo de valuation permite identificar o que está funcionando, pontos de atenção que podem ser alterados e oportunidades internas e externas à empresa;
2. Construção do modelo de projeção cuja última linha não é o lucro líquido e sim o fluxo de caixa livre disponível para o acionista.
Mesmo que se use o fluxo de caixa livre para a firma, isto é, para todos os seus fornecedores de capital, é importante que o modelo chegue até o fluxo de caixa livre para seus acionistas.
A construção do modelo envolve as seguintes atividades, todas elas fundamentais para uma gestão de qualidade:
- Planejamento de longo prazo que além de outras coisas, definirá o plano de negócios da empresa para os 5 a 10 anos seguintes;
- A análise dos impactos de diferentes tipos de funding de longo prazo no desempenho da empresa e na sua capacidade de criar valor de forma sustentável;
- Definição, com base no planejamento de longo prazo, dos principais drivers de valor na empresa;
- Análises de sensibilidade buscando calcular o valor intrínseco da empresa em função da mudança de uma ou mais variáveis.
3. Determinação do valor da empresa
Importante ter em mente que, com o modelo de planejamento de longo prazo pronto, podemos calcular o valor da empresa não só pelo fluxo de caixa descontado, mas também com base em outras metodologias usadas tais como múltiplos etc.
Nesta etapa, uma atividade de destaque deve ser a análise de determinação do custo do capital próprio (CCP) da empresa. Conceitualmente, o CCP é o retorno requerido pelo acionista ao investir nas ações da empresa. O CAPM (Capital Asset Pricing Model) é o método mais comum para sua determinação, mas não é o único. Além de input necessário no processo de valuation pelo fluxo de caixa descontado, o CCP deve ser usado também na análise de viabilidade de projetos e em outras decisões de investimentos.
Passei grande parte da minha carreira trabalhando em equity research onde meus principais clientes eram investidores institucionais. Uma das atividades da área era organizar a visita individual de empresas de capital aberto a estes investidores. A essa atividade dá-se o nome de non-deal road show pois estas visitas não estavam ligadas a operação alguma de mercado de capitais.
De forma semelhante estou me referindo a um non-deal valuation por defender que empresas devem passar por um processo de valuation mesmo se não estão considerando uma operação que envolva levantar recursos via equity.
Acho que ao descrever as etapas do processo de valuation eu tenha convencido que os benefícios que o processo de valuation traz vão muito além do saber qual o valor da empresa.
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Sobre o colunista
Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui mais de 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde junho de 2023 atua com gerenciamento de portfólios na Barra Peixe Investimentos. Entre 2019 e 2023 atuou como gestor do FIA Esh Prospera, e entre 2014 e 2016 contribuiu na coluna Palavra do Gestor do jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC-RJ, tem mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.
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