Bemobi e sua agressiva distribuição de dividendos: um caso interessante em finanças corporativas

Em 20 de março, a coluna Pipeline do Valor Econômico publicou matéria sobre a decisão da administração da empresa de aplicativos, games e serviços digitais Bemobi, listada na B3 sob o ticker BMOB3, de implementar uma agressiva política de distribuição de dividendos em 2025.
Lembrando que a Bemobi é um IPO da safra 2020/21. Desde seu primeiro dia de negociação, em fevereiro de 2021, as ações da empresa acumulam uma queda de 26% até o fechamento de 6ª feira, 21/03 (R$16,41). Desde novembro de 2021, o preço de suas ações flutua entre R$11,15 e R$16,70.
Em 2024, seu lucro líquido ajustado foi de R$129 Milhões, crescimento de 27% ano-contra-ano, seu EBITDA ajustado foi de R$200 Milhões (+14% Ano/Ano) e a receita líquida foi de R$608 milhões (+12% ano/ano).
Portanto, é uma empresa com resultado bem decente quando comparada aos resultados das demais empresas de tecnologia listadas na B3.
Voltando ao artigo do Pipeline, ele dizia que a empresa anunciou que irá distribuir R$200 milhões ao longo de 2025, que se soma aos R$58 milhões já distribuídos em janeiro de 2025.
Considerando o preço de fechamento de BMOB3 em 21/03/25, a distribuição adicional anunciada representa um dividend yield esperado de 14,3%.
Olhando para o histórico de distribuição de dividendos, vemos que em 2023 a empresa distribui R$20 milhões em 2023 e R$40 milhões em 2024.
Portanto, realmente a decisão da empresa é de aumentar agressivamente o retorno do acionista via distribuição de proventos e que vem junto com uma recompra de aproximadamente 10% das ações em circulação anunciado em agosto de 2024, válido por 18 meses.
Considerando que ao final de 2024 a empresa tinha R$589 milhões em caixa, a política agressiva de retorno para o acionista via distribuição de proventos faz sentido, desde que a empresa não tenha expectativa de implementar investimentos relevantes.
Mas a falta de um plano de investimentos agressivo pode ter impactos negativos sobre a percepção do mercado em relação ao futuro da empresa.
Por quê?
Ao adquirir uma empresa de tecnologia, o investidor busca primordialmente um crescimento bem acima da média. É por isso que ele está disposto a pagar múltiplos altos.
Já uma empresa com perfil de “boa pagadora de dividendos” é percebida como uma empresa com limitadas oportunidades de investimentos.
Claro que é melhor distribuir recursos do que gastar mal e destruir valor.
Mas acredito que ações de empresas de crescimento que sinalizam haver poucas oportunidades atraentes para investir tendem a sofrer.
Portanto a pergunta que eu faço aos investidores que gostaram do anúncio de dividendos agressivos é:
Vale comprar BMOB3 apenas pelo dividend yield esperado de 14%?
Esse é um caso típico de questionamento à estratégia de comprar ações com base apenas na sua política de dividendos.
Minha resposta à pergunta acima é não, apesar de reconhecer que um retorno de dividendos de 14% é interessante.
Por outro lado, sem expectativa de crescimento, as ações da BEMOBI devem permanecer de lado, como vem acontecendo desde o fim de 2021. Sem uma variação positiva no preço da ação, o retorno total para o acionista não será suficiente para compensar o retorno esperado para uma empresa de tecnologia, listada há pouco tempo, em um ambiente de mercado onde a taxa livre de risco (Título do Tesouro de Longo Prazo) está em 11,.5% e o prêmio de risco do mercado de ações está em 6%, pelo menos.
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Sobre o colunista
Sergio Goldman é colunista no Blog do Gorila e possui mais de 30 anos de experiência no mercado de capitais da América Latina com foco em Equity Research, Distribuição de Renda Variável e Wealth Management. Possui vasta experiência na venda de produtos de renda variável para investidores institucionais locais e estrangeiros, tendo trabalhado em instituições financeiras como Baring Securities, Bear Stearns, Santander, Unibanco e Safra. Desde junho de 2023 atua com gerenciamento de portfólios na Barra Peixe Investimentos. Entre 2019 e 2023 atuou como gestor do FIA Esh Prospera, e entre 2014 e 2016 contribuiu na coluna Palavra do Gestor do jornal Valor Econômico. Formado em Engenharia Eletrônica pela PUC-RJ, tem mestrado em administração na COPPEAD, escola de negócios da UFRJ.
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